terça-feira, 28 de abril de 2009

Quando eu era pré-adolescente, a moda entre as meninas era "fazer pastas". Eram umas coisas feias, geralmente pastas pretas com folhas de plástico tipo envelope, usadas também para guardar trabalhos de escola. O negócio de fazer pasta era colecionar os recortes de revista do (ou dos) ídolo(s). Naquela época parece que tinha muito mais revistas publicadas especialmente para este fim: para serem recortadas por meninas que gastavam todo o dinheiro da mesada em revistas chamadas "Gatos da TV".
Era época de Spice Girls, Backstreet Boys, Sandy e Jr (para quem assumia sem vergonha que gostava da dupla), mas, principalmente, de Leonardo DiCaprio. Titanic havia sido lançado no início de 1997, passado meses em cartaz e, em meados de 1998, as revistas ainda reservavam páginas e páginas para a Leomania. Todo mundo esperava o próximo filme de "Leo". E todas suspiravam pelo "Jack".
Assim como meninos trocavam figurinhas repetidas de jogador de futebol, as meninas trocavam fotos repetidas do Leonardo DiCaprio. Ou das Spice Girls, ou dos Backstreet Boys. Funcionava como uma moeda e os intervalos entre as aulas era de clima de tráfico internacional. Todo mundo corria para mostrar o que tinha e procurar alguém com a "moeda" desejada: uma foto nova, uma página de revista, um pôster. E eu, eu sempre saía perdendo, mas sempre com o sentimento de quem estava ganhando.
Todas as meninas normais gostavam do Leonardo DiCaprio ou dos "gatos" das boybands. Mas eu não era uma menina normal. Eu gostava do Rodrigo Santoro e fazia uma pasta com os recortes de revista sobre ele. Ninguém mais gostava do Rodrigo Santoro, então eu não tinha que disputar com ninguém: tudo o que surgia sobre ele era só meu. Em contrapartida, nunca saía nada sobre o Rodrigo Santoro em lugar nenhum. Ele não era um astro de Hollywood nem um cantor famoso que merecesse um pôster nas páginas centrais de uma revista teen. Era só um ator de 23 anos que tinha surpreendido a crítica e o público ao interpretar Frei Malthus, o "Santo", na minissérie Hilda Furacão. Mas meninas de 11 anos não tinham acompanhado Hilda Furacão, exceto eu, que assistia escondida e achava a coisa mais brilhante já feita na TV brasileira (no fundo, eu ainda acho).
A minha vida não era fácil. Além da dificuldade de achar revistas falando do Rodrigo Santoro (eu até já acessava a internet, mas quando lembro a pobreza que eram as páginas que o cadê! trazia como resultado, até me dá calafrios) enquanto as meninas compravam revistas especiais trazendo seu ídolo da capa a contra-capa, ainda tinha que aturar as críticas das perversas pré-adolescentes da sexta-série:
"Por que você fica colecionando coisas sobre esse cara?"
"Nada a ver!"
"Ele é feio!"
"É vesgo."
"Ele é cabeludo e barbudo, é ridículo!"
Na beleza loira e bem barbeada de Leonardo DiCaprio, imagino que o visual o-grunge-não-morreu do Rodrigo Santoro devia mesmo assustar as menininas leomaníacas. O fato é: Rodrigo Santoro era só um jovem ator que nem era o favorito das adolescentes de então, que preferiam "os gatos da Malhação". Gostar dele e perder tempo tendo-o como ídolo era loucura. Mas eu sempre soube que tinha alguma coisa muito diferente nele. Que ele não era só mais um daqueles galãs de estação, que tinham como objetivo virar protagonista de novela das oito e pegar o número máximo de modelos em busca de fama. Que ele era alguém que merecia atenção.
Quando Rodrigo começou a fazer mais sucesso, eu já tinha crescido, guardado a pasta no armário e começado a investir a minha mesada em festas e o meu tempo em garotos de carne e osso. Mas não deixei de acompanhar cada momento, desde as vaias no Festival de Brasília, em 2001 (aquilo me cortou o coração) até os mais recentes convites para atuar no cinema internacional. Me emocionei ao ver o nome dele nos créditos inicias de As Panteras - Detonando e sofri junto a humilhação de ser ironizado no próprio país por não ter falas no filme. Ainda fico arrepiada ao ver o comercial do Channel e me derreto com Guantanamera, a música de A Dona da História.

terça-feira, 16 de setembro de 2008


Sabia
Gosto de você chegar assim
Arrancando páginas dentro de mim
Desde o primeiro dia

Sabia
Me apagando filmes geniais
Rebobinando o século
Meus velhos carnavais
Minha melancolia

Sabia
Que você ia trazer seus instrumentos
E invadir minha cabeça
Onde um dia tocava uma orquestra
Pra companhia dançar

Sabia
Que ia acontecer você, um dia
E claro que já não me valeria nada
Tudo o que eu sabia
Um dia

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Uma geração sem rosto







Você já viu esse rostinho antes?


Provavelmente não, mas com certeza você já ouviu falar no nome desta garota. Quando esta foto foi tirada, em 1980, ela era uma das meninas mais famosas da Europa. Aos 18 anos, seu nome já era símbolo de uma parcela da juventude do final dos anos 70. Uma série especial de entrevistas com ela havia sido publicada três anos antes em uma das principais revistas do seu país natal, a Alemanha (no caso, a Alemanha Ocidental). Dessas entrevistas surge um livro e do livro, é feito um filme. A menina cuja imagem não podia ser mostrada e o sobrenome não era revelado além da primeira letra finalmente entrava na maioridade e podia aparecer para o público que a encarava como a promessa de esperança de uma geração.




Bonita, jovem, ela poderia se passar por uma simples jovem universitária de Berlim. Mas essa garota não chegou a terminar a escola: durante toda a adolescência, enquanto devia estar estudando, ela andava pelas ruas, passava as tardes na Estação Zoo e os fins de semana em um apartamento sem móveis e sem limpeza. Nas ruas ela arrumava clientes, na Estação Zoo comprava e usava a heroína que adquirira com o dinheiro do último programa e no apartamento sujo se sentia livre ao lado do namorado e dos outros amigos viciados.




A história de Vera Christiane Felscherinow, a famosa Christiane F., é um dos retratos mais assustadores da juventude do século XX. Como ela, centenas de adolescentes recém saídos da infância optavam por uma vida à parte na sociedade, se drogando e prostituindo. Quando essa foto de menina bonita e saudável foi publicada (ela havia acabado de passar por um processo de desintoxicação, dos inúmeros que fez durante toda a vida), muita gente achou possível esquecer o retrato de Babette Döge, a menina de 14 anos que fora capa de todas as publicações apenas quatro anos antes. Ela era conhecida como Babsí, era uma das melhores amigas de Christiane F. e as manchetes na imprensa alardevam: "A mais jovem vítima de heroína da Europa: Ela só tinha 14 anos!"








Quando Christiane contou sua história, em um livro que ficaria por dois anos no topo da lista dos mais vendidos da Alemanha, ela revelou também a trágica história de Babsí: aos 13 anos, já estava viciada, prostituída, fora seqüestrada por um cafetão, torturada durante um estado de abstinência da droga e estuprada por diversos homens. Era a prostituta infantil de maior sucesso entre as jovens drogadas: era a mais bonita e, mesmo quando muito magra por causa da heroína, Christiane dizia que ela continuava parecendo uma debutante da elite. Mas não houve um Babette D., assim como não houve muitos outros relatos de meninos e meninas, fossem eles da Alemanha ou de qualquer outro país, nos anos 70 ou no início do século XXI. Christiane F, hoje com 45 anos, jamais se livrou das drogas. Sua principal fonte de renda ainda vêm do dinheiro que recebe pelos direitos da sua história publicada em livro e relatada no cinema, já que ela não consegue permanecer em nenhum emprego muito tempo. Mas quase ninguém mais compra o livro Eu, Christiane F, 13 anos, drogada e prostituída e nem quer ver o filme de mesmo nome. É uma história do passado, de uma juventude muito distante destes que hoje se comunicam por messenger, escutam David Bowie em iPods e vão à raves tomar balas coloridas com o nariz empinado de uma geração que sabe muito mais do que as gerações antigas, dos "nossos" pais (e em pouco tempo, Christiane F. será da geração dos "nossos" avós...)


quarta-feira, 30 de abril de 2008

A Livraria da esquina

Eu sou uma traíra. Eu traí a Livraria Midas.

Percebi essa traição quando saí de lá há cerca de um mês, depois de conversar com a dona Margareth Drefahl, sócia-proprietária da Livraria, para o projeto de assessoria de comunicação que minha equipe está produzindo para a aula de Comunicação Institucional.



A Livraria Midas nasceu em 1984. Eu nasci em 1986. Poucos anos se passaram até que a paixão finalmente surgisse. Aos 7 anos, eu já tinha naquela livraria de esquina a idealização do lugar perfeito. Não podia passar pela frente da loja que o coração batia mais acelerado. Tudo o que existia de mais perfeito no universo estava lá dentro. Prateleiras e prateleiras lotadas de livros, um número incontável de histórias e personagens esperando para serem conhecidos, para me fazerem companhia nas tardes, nas noites e nos sonhos. E o melhor, era possível entrar lá e TOCAR nos livros. Não era necessário pedir para um adulto mal humorado que trouxesse o exemplar de uma prateleira atrás de um balcão que meus poucos anos somados à pouca estatura faziam parecer com o Muro de Berlim, cheio de torres de observação, redes metálicas e cães ferozes. Eu odiava aquele balcão daquela outra livraria, a única que existia além da Midas na época e que logo fechou ("Bem feito", eu disse entredentes, na minha banguela de 8 anos).



E foi aos 8 anos que eu conheci a dona Margareth Drefahl, sem ter noção que ela se chamava Margareth, era dona da Livraria e também odiava balcões separando os leitores dos livros e por isso construiu uma livraria em que os objetos sagrados ficavam à disposição nas estantes. Eu era uma criança estranha que, no Natal de 1994, quando todas as crianças se preparavam para ganhar um par de rollers, os famosos patins inline que viraram moda naquele ano, eu havia negociado com meus pais que, em vez de ganhar os patins de R$ 85,00 que eram o pesadelo deles (brinquedo caro com consequências caras: dentes quebrados, joelhos ralados, cabeças batendo na calçada) eu iria ganhar quatro livros. De certa forma, quatro bons livros infantis equivaliam quase ao valor de um par de patins.



E lá estava eu com a minha mãe paciente e uma vendedora paciente que já estavam desesperadas com aquela criança que, depois de uma hora, ainda não havia se decidido pelos quatro livros. Mas vejam bem, eram 4 livros. QUATRO livros. Não eram uma decisão fácil. As consequências poderiam ser fatais. Desperdiçar aquela oportunidade não era parte dos meus planos. Foi quando surgiu dona Margareth, provavelmente intrigada com aquela criaturinha de um metro e trinta que há uma hora enlouquecia a mãe e a vendedora em meio às prateleiras de livros infantis. Ela foi conversar com a minha mãe, que explicou o motivo da compra e da demora. "Ela quer livros de presente de Natal. Quatro livros." Espantada com minha lista pro Papai Noel, dona Margareth propôs: "Escolha três livros e o quarto eu lhe dou de presente. É um presente meu, da livraria".



Minha mãe, obviamente, adorou a sugestão. Eu, obviamente, odiei. Aquilo me tirava a oportunidade de escolher um dos livros, prazer que era quase semelhante ao ato de ganhar os livros! Escolhi, resignada, três dos possivelmente 3.756.473 livros pré-selecionados e aguardei o presente da dona Marga. Ela voltou do estoque, onde fora buscar o tal presente e, para minha surpresa, não trazia apenas um, mas dois livros. Não sei dizer quais foram os três livros que escolhi naquele dia. Eles hoje se misturam aos livros que comprei em todas as outras vezes em que voltei àquelas prateleiras da Livraria Midas para buscar meu presente de aniversário, dia das crianças e Natal, além das datas não festivas em que consegui um livro após muito aporrinhação e birra. Mas me lembro perfeitamente dos livros que ganhei da dona Margareth naquele Natal. Um deles era Os Nadinhas, do Assis Brasil e o outro era Sozinha no Mundo, do Marcos Rey. Livros que quase perderam a cor de tanto que li e reli.



Mas eu traí a Livraria Midas. Não sei o dia ou o mês, nem mesmo o ano em que comecei a trair. Minha defesa é que minha pouca idade, provavelmente 13 ou 14 anos, e os três andares da Livrarias Curitiba dentro do shopping Mueller, tudo muito iluminado, colorido e cheirando a café e bolo do quiósque do terceiro andar, me seduziram e me levaram a cometer esse ato atroz. Durante os últimos 5 ou 6 anos eu entrei poucas vezes na Livraria Midas, especialmente depois que ela trocou uma esquina por outra e virou um prédio mais bonito, mais requintado. Só me dei conta da traição agora, ao encarar a tarefa de criar um projeto de assessoria para o meu antigo paraíso, com direito a uma coletiva de imprensa que me levou à loucura na noite de ontem.



Bom, acho que todo mundo tem direito a uma segunda chance, não é? Minha primeira compra na volta à Livraria Midas foi um livrinho de plástico de quatro páginas. Não são quatro livros, tudo bem, mas dá para usar na banheira e morder. Claro que esse livro não é para mim, mas para a Alice, filha da minha amiga Joyce (também "assessora" da Livraria Midas), que no dia 2 de maio de 2008 faz um ano de vida. Quem sabe não começa aí uma nova história de amor?







(A Livraria da Esquina de Meg Ryan no filme Mensagem para Você: loja de uma apaixonada por livros ameaçada pela filial de uma rede nacional de livrarias do Tom Hanks)

sábado, 12 de abril de 2008




Havia um muro alto entre nossas casas.

Difícil de mandar recado para ela.

Não havia e-mail.

O pai era uma onça.

A gente amarrava o bilhete numa pedra presa por um cordão

E pinchava a pedra no quintal da casa dela.

Se a namorada respondesse pela mesma pedra

Era uma glória!

Mas por vezes o bilhete enganchava nos galhos da goiabeira

E então era agonia.

No tempo do onça era assim.



Mesmo que a Feira do Livro de Joinville seja uma porcaria, ouvir um poeminha desse às 9 da manhã de sábado, quando você ainda está sonolenta após uma sofrida noite mal dormida vale todas as tentativas toscas da cidade de construir um lado cultural.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Hey, whatever happened to Xuxa?

Morreu Norman Mailer. Escritor, jornalista, ganhador duas vezes do Prêmio Pullitzer, o "Enfant Terrible", o cara que brigou com Truman Capote, Tom Wolfe e Gore Vidal. Morreu aos 84 anos, de insuficiência renal, depois de uma vida de delírios, exageros e brigas.

Eu não comecei este post com a intenção de falar de Norman Mailer. Eu nunca li Nornan Mailer, apesar de ele estar na minha lista de espera de literatura (e essa lista cresce tanto que eu precisaria de algumas vidas extras para cumprí-la). Eu, na verdade, conheci Norman Mailer por outra fonte. Através de um "Gilmore-ism".

Você talvez não saiba o que é um "Gilmore-ism" e nem tenha a intenção de saber. Quando eu contar, então, é capaz de perder a paciência e parar de ler este texto. Afinal, "Gilmore-ism" nada mais é do que uma expressão criada para designar as referências e as frases memoráveis do seriado americano Gilmore Girls.

Gilmore Girls estreiou na TV americana em 5 de outubro de 2000 e teve seu 152º e último episódio em 15 de maio de 2007. Aos olhos cansados e machistas, deveria parecer um programa de mulherzinha, cheio de drama, romance e todo o (problemático) cotidiano feminino. E era, realmente. Mas era mais do que isso também. Extremamente bem escrito, o seriado era uma fonte inesgotável de frases brilhantes, metáforas irônicas e muitas, muitas referências culturais.

Ao assistir a um episódio de Gilmore Girls você podia encontrar uma discussão sobre como Ernest Hemingway perdeu alguns de seus preciosos escritos ou ver um estudante de jornalismo provocar outro usando a experiência de Hunter Thompson na reportagem sobre os Hell's Angels. Uma discussão sobre como o frio estava de enlouquecer num episódio em que o aquecedor da casa das garotas Gilmore está quebrado podia ser coroado pela frase: "Ei, ninguém nunca parou para pensar que talvez Sylvia Plath não era louca, ela estava apenas com frio?" Bom, isso é muito engraçado se você faz parte do grupo de pessoas que sabe que Sylvia Plath se suicidou enfiando a cabeça na saída de gás.

Mas não só de referências jornalísticas e literárias vivia Gilmore Girls. Alusões a cultura pop e a fatos (leia-se fofocas) recentes, também recheavam o seriado. "É só um casamento falso, mãe. J. Lo faz isso o tempo todo" encerrava um assunto, assim como o célebre "Ei, alguém sabe o que aconteceu com a Xuxa?" (A rainha dos baixinhos brasileiros tentou emplacar um Xou da Xuxa para os baixinhos americanos no início dos anos 90, sem sucesso. Pobre moça fracassada, eles devem pensar...)

Participações especiais em Gilmore Girls também faziam parte da rotina, mas nunca de forma normal. O cantor e compositor Paul Anka passou a ser citado freqüentemente quando, na sexta temporada, Lorelai se sentiu sozinha e resolveu comprar um cachorrinho, a quem deu nome e sobrenome: Paul Anka. Em um início de episódio, eis que aparece o próprio Paul Anka em um sonho de Lorelai: nele, o Paul Anka humano é alimentado e acariciado como se fosse o Paul Anka cachorro.

E foi numa dessas participações especialíssimas que Norman Mailer deu o ar de sua graça no seriado. No episódio, Sookie, a chef e sócia da pousada de Lorelai, fica irritada com o escritor, que usa a sala de chá do local para uma entrevista mas não aceita nada além de chá gelado. Após um episódio inteiro de atritos entre o "Enfant Terrible" e Sookie, a descoberta e o grito "Norman Mailer, eu estou grávida!"

Meu diálogo preferido:

Lorelai: Você estava ao telefone?
Richard (pai de Lorelai) : Longa distância.
Lorelai: Deus?
Richard: Londres.
Lorelai: Deus vive em Londres?
Richard: Minha mãe mora em Londres.
Lorelai: Sua mãe é Deus?
Richard: Lorelai...
Lorelai: Então... Deus é uma mulher!
Richard: Lorelai.
Lorelai: E uma parente... Isso é tão legal. Eu vou pedir um monte de favores.
Richard: Faça-a parar...
Rory: Oh, se eu pudesse...!

(Episódio 1x18 - The Third Lorelai)